UA estuda técnica inédita no país contra a erosão
depois dos incêndios florestais
Reduzir drasticamente o nível de erosão dos solos florestais depois da
ocorrência de um incêndio é o grande objectivo do mulching. Tendo em conta que
após um incêndio a erosão por acção da água das chuvas pode levar a perdas de cerca de 50 toneladas de solo, a técnica em estudo pela UA pode reduzir a
escorrência de águas nos terrenos ardidos em mais 40 por cento e, com isso,
diminuir a erosão do solo em 90 por cento.
O método inovador que a UA quer introduzir em Portugal, e que em tradução livre se pode designar por ‘acolchoado’, consiste na distribuição pelos solos consumidos pelo fogo de uma camada de restos florestais triturados.
“Com a vegetação e a manta morta da superfície dos terrenos transformados
em cinzas o solo fica extremamente vulnerável à acção da erosão”, aponta Sérgio Alegre. O investigador do Centro de Estudos do Ambiente e do Mar (CESAM) da UA,
e responsável pelos primeiros estudos em Portugal da utilização do mulching, relata que há terrenos que chegam a perder várias dezenas de toneladas de
solo por hectare durante o primeiro ano depois de um incêndio.
“As implicações negativas que este cenário acarreta vão desde a perda de
fertilidade e produtividade dos solos até à destruição dos ecossistemas e bens
a jusante das áreas afectadas como é o caso de caminhos, pontes, praias
fluviais ou propriedades”, diz o investigador.
O problema da erosão adensa-se, por exemplo, quando esta afecta o normal funcionamento de barragens e centrais hidroeléctricas. “Com a acumulação das
toneladas de sedimentos levados pela chuva até aos rios, e destes até às
albufeiras das barragens, estas podem perder o volume útil para armazenar a água,
o que leva à necessidade do seu desassoreamento e limpeza para poder acumular
mais água”, explica Sérgio Alegre.
Ainda que em Portugal o desaparecimento do solo por erosão após incêndio
não esteja muito bem estudado, Sérgio Alegre aponta para investigações
realizadas em “países que têm uma longa tradição nesses estudos”, nomeadamente
nos EUA, onde as perdas podem atingir até 65 toneladas por hectare ardido
durante o primeiro ano após o incêndio. Aqui bem perto, na Galiza, já se
quantificaram perdas de 10 a 35 toneladas por hectare durante um ano. “No caso
de Portugal, só agora começamos a ter algumas estimativas, mas são medições
pontuais em pequenas parcelas de erosão, pelo que é preciso continuar a
investigar para conhecer os efeitos dos incêndios a escalas maiores”, refere.
Matérias primas à mão de semear
Níveis de pluviosidade, inclinação dos terrenos, características
geológicas, clima, tipos de vegetação e ciclo de incêndios a que o terreno tem
estado sujeito são alguns dos factores ligados ao processo de erosão e que
influenciam as perdas de solo. “Depois de um incêndio é preciso avaliar as
zonas onde há risco de erosão. É claro que não podemos tratar toda a superfície
ardida com o mulching porque seria inútil
aplicá-lo nalgumas áreas que não precisam”, aponta Sérgio Alegre. É o caso das
áreas sem declive ou áreas ardidas com uma baixa intensidade do fogo onde as
árvores ainda possuem folhas nas copas que, depois de caírem, fornecem de uma protecção natural ao solo. No caso dos pinhais, “a caruma funciona como um mulching natural tão efectivo como os restos florestais
triturados”.
Matérias-primas para triturar a pensar no ‘acolchoamento’ não faltam em
Portugal. “Pode-se aplicar as toneladas e toneladas de cascas de madeira que
não são utilizadas pelas fábricas de pasta de papel. É um material muito bom
pois tem fibras longas que se adaptam ao solo formando uma espécie de rede que
retém água e sedimentos”, explica o investigador do CESAM. O mulching pode igualmente fazer uso do que sobra
das podas e de “restos derivados das limpezas dos matos, dos jardins ou das
bermas das estradas que, na maioria dos casos, são enviados para lixeiras”.
Técnicas actuais ineficazes
Aplicado à mão ou com recurso a meios aéreos sobre os terrenos mais
expostos a fenómenos de erosão, o mulching pretende substituir as
“ineficazes” mas muito usadas barreiras de madeira cravadas nos solos ardidos
para reterem águas e sedimentos. Sérgio Alegre aponta que “ em comparação com o mulch, essas barreiras, não cumprem a função de reter as águas e de mitigar a
perca de sedimentos dos terrenos expostos à erosão”.
Pelo contrário, o investigador do CESAM, garante que o mulch, numa primeira fase, reduz as perdas de solo e, posteriormente, através da
própria decomposição dos restos florestais, acaba por se incorporar no
ecossistema florestal. “Como é um material que pode reter água por absorção ou
por retenção nas micro-barreiras que as fibras formam, este método reduz a
quantidade de água que flui para os rios até 40 ou 50 por cento”, explica
Sérgio Alegre.
O processo, que “dá o mesmo trabalho que a colocação das barreiras”, pode
evitar despesas maiores. O investigador não tem dúvidas: “Se com esta técnica
se evitar que a perda do solo, um recurso não renovável à escala humana, leve à
alteração dos ecossistemas aquáticos a jusante da área ardida, ou que, por
exemplo, uma barragem fique cheia, então os gastos estão mais do que
justificados”.
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